Lei n. 14.421/2022: alterações no ambiente privado de financiamento do agronegócio

Ontem, 20 de julho de 2022, foi publicada a Lei nº 14.421/2022 que converteu a MP nº 1.104 e alterou diversos dispositivos de relevância ao setor e ao financiamento privado do agronegócio, como a Lei nº 8.929/1994 (Lei de CPR) e a Lei nº 13.986/2020 (Lei do Agro). Aqui, insta serem salientadas as mudanças de maior relevância e que representam um avanço significativo das diretrizes legislativas do setor.

  • Lei nº 8.929 de 1994.

Iniciando as disposições sobre o principal título de crédito do agronegócio nacional, a Cédula de Produto Rural (CPR), foi procedida modificação significativa no artigo 1º, §2º da Lei de 1994, passando a ser – mais uma vez – ampliado o rol de produtos passíveis de emissão:

I – agrícola, pecuária, florestal, de extrativismo vegetal e de pesca e aquicultura, seus derivados, subprodutos e resíduos de valor econômico, inclusive quando submetidos a beneficiamento ou a primeira industrialização;

II – relacionadas à conservação, à recuperação e ao manejo sustentável de florestas nativas e dos respectivos biomas, à recuperação de áreas degradadas, à prestação de serviços ambientais na propriedade rural ou que vierem a ser definidas pelo Poder Executivo como ambientalmente sustentáveis;

III – de industrialização dos produtos resultantes das atividades relacionadas no inciso I deste parágrafo;

IV – de produção ou de comercialização de insumos agrícolas, de máquinas e implementos agrícolas e de equipamentos de armazenagem.

É notável, portanto, a preocupação do legislador em garantir fonte de financiamento a maior gama de atividades.  Além disso, a redação do artigo 2º do mesmo dispositivo foi alterada quanto à legitimidade para emissão do título:

Art. 2º Têm legitimação para emitir CPR:

I – o produtor rural, pessoa natural ou jurídica, inclusive com objeto social que compreenda em caráter não exclusivo a produção rural, a cooperativa agropecuária e a associação de produtores rurais que tenha por objeto a produção, a comercialização e a industrialização dos produtos rurais de que trata o art. 1º desta Lei;

II – as pessoas naturais ou jurídicas que beneficiam ou promovem a primeira industrialização dos produtos rurais referidos no art. 1º desta Lei ou que empreendem as atividades constantes dos incisos II, III e IV do § 2º do art. 1º desta Lei.

No aspecto tributário, foi relevante a alteração do §2º do art. 2º da Lei de CPR, que passa a prever a incidência de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nas emissões realizadas por pessoas naturais ou jurídicas que beneficiam ou promovem a primeira industrialização de produtos agrícolas, bem como, àquelas que explorem as atividades previstas nos incisos II, III e IV do supracitado artigo 1º, portanto, atividades de manejo, recuperação ou conservação florestal, de industrialização ou de produção e de comercialização de insumos agrícolas, de máquinas e implementos agrícolas e de equipamentos de armazenagem.

Quanto ao registro e depósito da Cédula de Produto Rural (CPR), o artigo 12 da Lei nº 8.929/1994 agora prevê prazos distintos, de forma a ser obrigatório o registro ou depósito da CPR: (i) emitida até 10 de agosto de 2022, em 10 (dez) dias e (ii) emitida a partir de 11 de agosto de 2022, em 30 (trinta) dias.

  • Lei nº 8.668 de 1993.

Outro diploma que sofreu alterações significativas foi a Lei nº 8.668/1993, especificamente no tópico do Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro).

A nova legislação prevê que, agora, haverá a possibilidade de o Fiagro aplicar recursos em ativos financeiros que forem emitidos por pessoas naturais ou jurídicas integrantes da cadeia agroindustrial, expandindo a tutela, inclusive, para CPR física ou financeira.

  • Lei nº 11.076 de 2004.

Partindo, por sua vez, para a ótica da Lei nº 11.076/2004, a Lei dos Títulos de Crédito do Agronegócio, a alteração deu-se em dois pontos distintos acerca dos títulos CDA e WA. O art. 5º da Lei 11.076/2004 dispõe sobre as informações inseridas nestes títulos, e a nova redação passa a prever, no inciso XVII, que a identificação qualificação e assinatura dos representantes legais do depositário poderão ser efetuadas de forma eletrônica.

Na mesma toada, mas quanto à emissão e depósito de CDA e WA, a lei de conversão da MP 1.104 altera o §1º do art. 15, agora dispondo que:

§ 1º O depósito de CDA e de WA emitidos sob a forma cartular em depositário central será precedido da entrega dos títulos à custódia de instituição legalmente autorizada para esse fim, por meio de endosso-mandato, que poderá ser feito de forma eletrônica, conforme legislação aplicável.

  • Lei nº 13.986 de 2020.

Relevante dispositivo regulador dentro do agronegócio, a Lei nº 13.986/2020, Lei do Agro, foi verdadeira abertura de portas do setor, e, considerando essa característica, a alteração legislativa também a afeta. Já no artigo 3º, sobre os participantes do Fundo Garantidor Solidário (FGS), a Lei nº 14.421/2022 estabelece:

Art. 3º Os participantes integralizarão os recursos do FGS, observada a seguinte estrutura de cotas:

I – cota primária, de responsabilidade dos devedores; e

II – cota secundária, de responsabilidade do garantidor, se houver;

III – (revogado).

Ainda sobre o FGS, o art. 6º da Lei nº 13.986/2020 versa sobre Estatuto do Fundo, e, com a modificação, este deverá conter em suas disposições a forma de constituição e administração, a remuneração do administrador, a utilização dos recursos e a forma de atualização, a representação ativa e passiva e a aplicação e gestão dos ativos.

A alteração legislativa abrange, também, quanto ao Patrimônio Rural em Afetação (PRA), inserindo dois novos parágrafos no art. 7º para disporem sobre a caracterização do instituto. O §2º trata sobre o PRA dado em garantia constituir direito real sobre o respectivo bem e o §3º tutela que o PRA em garantia deverá ser submetido às regras quanto ao instituto de alienação fiduciária do imóvel, previsto tanto no Código Civil, quanto na Lei nº 9.514/1997.

Ainda quanto ao PRA, a lei de conversão da MP 1.104 altera os artigos 9º e 12.  O artigo 9º agora tutela:

Art. 9º O patrimônio rural em afetação é constituído por requerimento do proprietário, por meio de registro na matrícula do imóvel.

§ 1º Para fins da constituição de que trata o caput deste artigo, o oficial deve certificar-se de que a descrição do imóvel matriculado atenda ao disposto no § 3º do art. 176 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Lei de Registros Públicos).

§ 2º Quando o patrimônio rural em afetação for constituído por parcela determinada de uma área maior, serão registradas na respectiva matrícula as descrições da parcela objeto de afetação e da parcela remanescente.

§ 3º Na ocorrência de excussão de parcela determinada de imóvel objeto do patrimônio rural em afetação, o credor poderá requerer seu parcelamento definitivo previamente ao registro do título aquisitivo para fins de pagamento.

§ 4º No caso do registro de parcelamento definitivo de que trata o § 3º deste artigo, que deverá ocorrer em consonância com o que fora anteriormente registrado na matrícula do imóvel, o oficial exigirá a apresentação da certificação do georreferenciamento da área excutida perante o Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).”

No artigo 12, por sua vez, a alteração se deu exclusivamente (i) no inciso I, alínea “d”, cuja redação trata sobre a certificação desse instituto, agora devendo ser feita perante o Sigef/Incra, do georreferenciamento do imóvel que está sendo constituído o patrimônio rural em afetação e (ii) no §2º, quanto à constituição do patrimônio rural em afetação sobre parte do imóvel, e, agora, a fração não afetada deverá atender a todas as obrigações ambientais previstas em lei, inclusive em relação à área afetada.

  • Conclusão final.

Destarte, a Lei nº 14.421/2022 demonstra ser um importante e novo paradigma regulatório do agronegócio nacional, atualizando características de funcionamento e operabilidade dos mecanismos do setor, mas também acarretando mudanças com aspecto conceitual e expandindo ainda mais o alcance do agro e de suas atividades e produtos, inserindo, na alçada do financiamento uma maior possibilidade de atuações. Resta, agora, aguardarmos como essas atualizações serão operacionalizadas.

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