Profert como saída para possível escassez de fertilizantes

PL 3507/21 busca desonerar investimentos para ampliar infraestrutura de produção de fertilizantes e insumos

A instabilidade política, econômica e social no mundo ocasionada pelo enfrentamento militar entre Rússia e Ucrânia tem sido palco de discussão nas últimas semanas. Não poderia ser diferente: essa é a maior agressão militar em solo europeu desde o fim da Segunda Guerra Mundial. O mote principal do conflito, segundo apresentado pela mídia e tratado por especialistas, reside na integração ucraniana à União Europeia e à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). A situação de expressiva violência nos reforça, mais uma vez, quão conectado é o mundo e o quão necessária é a boa convivência e cooperação entre as nações, nas mais variadas vertentes, inclusive, econômica. Temos, hoje, mercados integrados e interconectados, também no agronegócio.

Os Sistemas Agroindustriais (SAGs) operam gerando verdadeiro complexo que interage com diversas áreas da economia nacional e internacional. Assim, os impactos de um confronto mundial lhe comprometem em todas as etapas produtivas, ou seja, desde a produção, até a chegada do produto ao consumidor final, esteja este em território nacional ou não. A posição brasileira e os envolvidos na guerra, porém, fazem saltar aos olhos um problema em específico: fornecimento de insumos à produção, em destaque, os fertilizantes.

Ucrânia, Belarus e, principalmente, a Rússia são os maiores fornecedores de fertilizantes do mundo, em especial o cloreto de potássio do qual o agronegócio brasileiro é grande importador e dependente. Segundo apontado pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, 90% do consumo nacional desse insumo tem origem no exterior. Ainda, o elevado aumento da produtividade brasileira já confirmado nos últimos anos e projetado para os seguintes demandará, cada vez mais, o uso de insumos à lavoura em larga escala, pressionando a demanda pela importação, caso não haja um aumento da produção interna desses produtos.

A apontada situação emite um alerta ao território nacional: a falta na oferta dos insumos pode ocasionar a impossibilidade da produção e a perda de safras. Caso as restrições mundiais se mantenham, é possível que já no início do segundo semestre do ano nos deparemos com a falta de fertilizantes em território nacional, encarecimento de mercadorias e, assim, diminuição nas ofertas de produtos e exportações. A isso, somam-se todos os riscos e instabilidades políticas decorrentes de ano eleitoral, tudo inclinando para afetar, direta e indiretamente, o agronegócio nacional.

Compreendendo o grande impacto que a falta de fertilizantes gerará na produção agrícola brasileira, faz-se necessária a criação e o aprimoramento que limitem ou comprimam a dependência, tanto de mecanismos jurídico-legais quanto mecanismos físicos propriamente ditos, mas, para tanto, a modernização da regulação é imprescindível.

Em janeiro de 2021, foi instituído um grupo de trabalho interministerial com a finalidade de desenvolver o Plano Nacional de Fertilizantes e fortalecer o debate acerca da melhor metodologia de política de produção e distribuição de fertilizantes no Brasil (Decreto nº 10.605, de 22 de janeiro de 2021).

Ante a situação de conflito e urgência de medidas, no último dia 11 foi oficialmente lançado pelo governo federal o Plano Nacional de Fertilizantes, que categoriza algumas das ações públicas e privadas com precípuo de ampliar a produção competitiva de fertilizantes no Brasil, diminuir a dependência externa tecnológica e de fornecimento e ampliar a competitividade do agronegócio brasileiro no mercado mundial, respeitando regulamentações internacionais.

Segundo apresentado pelo próprio plano, as importações desses produtos ocasionaram a externalização de mais de US$ 9 bilhões em 2020, valores esses que poderiam ser direcionados ao melhor desenvolvimento de uma indústria interna e utilizados para a geração de renda e empregos no Brasil.

Analisando a temática sob o prisma tributário, vale dizer que, atualmente, os fertilizantes e seus insumos estão sujeitos à tributação em operações interestaduais e a tributos federais. A título de exemplo, a carga tributária incidente em fertilizantes cujo potássio é o composto químico utilizado na produção chega a 41,6%. Por sua vez, em fertilizantes produzidos a base de fósforo, a tributação atinge 30,08% da precificação final.

Nesse sentido, e sem o condão de analisarmos o custo tributário das operações de produção de fertilizantes, é importante citar um projeto de lei existente, capaz de impulsionar essa indústria. O PL 3507/2021, apresentado pelo deputado Laercio Oliveira (PP-SE), cria o Programa de Desenvolvimento da Indústria de Fertilizantes (Profert) e visa a desonerar os investimentos em projetos de implantação, ampliação ou modernização de infraestrutura para produção de fertilizantes e de seus insumos. De forma geral, destacam-se os seguintes incentivos fiscais:

  • suspensão do pagamento, com posterior conversão em alíquotas zero, ou isenção, conforme o caso, da Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS/Pasep), PIS/Pasep-Importação, Contribuição Social para ao Financiamento da Seguridade Social (Cofins), Cofins-Importação, Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), IPI vinculado à importação e Imposto de Importação em operações realizadas por pessoas jurídicas beneficiárias do regime;
  • não incidência do Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) e a aplicação de alíquota zero do Imposto de Renda na Fonte e da Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico (Cide);
  • a inclusão no benefício fiscal de redução para zero das alíquotas da Contribuição para o PIS/Pasep e Cofins dos insumos utilizados na cadeia produtiva de fertilizantes e da receita bruta da prestação dos serviços vinculados à cadeia produtiva.

Além disso, há previsões sobre ajustes no custo tributário relativo à folha de salário, em razão do alto índice de mão de obra necessária para o desenvolvimento dessa cadeia produtiva, bem como a estipulação de um prazo factível para que as empresas envolvidas tenham celeridade e simplicidade em relação ao procedimento administrativo de ressarcimento de tributos vinculados à atividade de fabricação de fertilizantes.

O amplo desenvolvimento de determinados setores estratégicos do nosso país, em muitos casos, deu-se por meio de concessões de regimes especiais de tributação. Para melhor exemplificar, podemos citar o Regime Tributário e Aduaneiro Especial de utilização econômica de bens destinados às atividades de exploração, desenvolvimento e produção das jazidas de petróleo e de gás natural (Repetro-Sped) e o Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento de Usinas Nucleares (Renuclear).

Com o crescimento exponencial do agronegócio brasileiro, a modernização de nossas práticas, regulações e insumos devem caminhar em compasso, para que o desempenho seja compatível. O Profert representa um passo além no desenvolvimento do agronegócio nacional e pode, não apenas em momentos de crise como o experienciado, ser uma boa saída para a maior independência econômica brasileira.

BÁRBARA HELENA BREDA – Diretora-executiva do Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio (IBDA), coordenadora acadêmica do Expertise VBSO, especialista em direito & economia dos Sistemas Agroindustriais pela Faculdade CNA e pós-graduanda em meio ambiente e sustentabilidade pela FGV
THALES FALEK – Sócio da área tributária do Carrilho Donas, Guimarães e Falek Advogados e cofundador do Grupo de Estudos da Tributação do Agronegócio
HELOISA CAUM – Assistente acadêmica do Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio (IBDA) e graduanda em direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie

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